O Supremo Tribunal Federal (STF) recebeu, nesta segunda-feira (21), 40 especialistas para debater o uso de depósitos judiciais no custeio de despesas públicas. O tema foi abordado na audiência pública convocada pelo ministro Gilmar Mendes, relator da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5072, que questiona o estado do Rio de Janeiro sobre a utilização desses recursos.
Na avaliação do ministro, a decisão a ser tomada pelo STF vai refletir na execução e controle das contas públicas nos estados, daí a necessidade de discussão do tema em audiência pública. A ação foi ajuizada pela Procuradoria Geral da República para questionar lei estadual do Rio de Janeiro (RJ), que permite a utilização de parte dos depósitos judiciais para quitação de requisições judiciais de pagamento.
O ministro relator da ADI, Gilmar Mendes, afirmou que a questão é complexa, com consequências para as finanças públicas e que envolve cifras importantes. Citou como exemplo números apresentados nos autos da ação pela Caixa Econômica Federal – um montante de R$ 12,2 bilhões oriundos de depósitos judiciais na Justiça Federal, R$15,8 bilhões na Justiça Estadual e 19,8 bilhões na Justiça do Trabalho. Já o Banco do Brasil (BB) informou que seu montante em depósitos judiciais está em R$ 90,9 bilhões provenientes da Justiça nos Estados e 19,7 bilhões da Justiça Trabalhista.
Já o ministro Edson Fachin levantou uma série de dúvidas e questionamentos sobre depósitos judiciais que, segundo ele, gostaria de sanar com a participação dos representantes dos estados, municípios, bancos e Tesouro Nacional.
Estados
Representantes da Fazenda Pública dos estados do Rio de Janeiro, de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul, da Paraíba, Bahia, além do Distrito Federal e do Município de São Paulo defenderam a utilização pelos governos estaduais dos depósitos judiciais para o custeio das despesas públicas, e afirmaram que têm condições de honrar a utilização desses depósitos, explicando a situação em que se encontram em relação às suas dívidas públicas e ao pagamento de precatórios.
O representante do Governo do estado do Rio de Janeiro (RJ) apresentou números e destacou que o estado pagou, em 12 anos, 75% do montante de seus precatórios. “Hoje podemos dizer que o estado do Rio de Janeiro está absolutamente em dia com suas dívidas de precatórios. Este ano serão pagos mais de R$ 220 milhões, totalizando mais de 20 mil precatórios pagos”, frisou o Procurador-Geral do Estado do Rio de Janeiro (PGE/RJ), Saint-Clair Souto.
Municípios
Estiveram presentes na audiência representando os municípios a Procuradora do município de Porto Alegre (RS) e representante do Fórum Nacional de Procuradores das Capitais, Cristiane da Costa Nery e o Procurador-Geral do município de São Paulo, Robson Barreirinhas. Participou ainda dos debates o vice-prefeito de Belo Horizonte, Délio Malheiros.
Cristiane Nery defende o tratamento igualitário para a utilização desses recursos, entre estados e municípios. “O que nós procuramos trazer é a necessidade de que haja um tratamento isonômico, um regramento igualitário e que todos os entes da federação possam fazer uso desse mesmo instituto porque todos têm as mesmas dívidas, são dívidas comuns. A utilização de recursos dos depósitos judiciais é uma alternativa que precisamos para ter a saúde financeira dos estados, municípios e União. É uma alternativa possível, sem risco algum e que prioriza o interesse público. Eu penso que a priorização do interesse público é o que todos nós deveríamos defender”, enfatizou.
O Procurador-Geral de Belo Horizonte (MG), Rúsvel Beltrame Rocha, que representou a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) na audiência, ressaltou que o estoque de precatórios se concentra em apenas 45 municípios. “Dos 5.570 municípios brasileiros, apenas 45 têm estoques de precatórios a pagar. Destes, 70% do valor total está no estado de São Paulo. Então dizer que há um problema geral em relação ao pagamento de precatórios?”, questionou o representante de Belo Horizonte. Rúsvel sugeriu ainda que para os mal pagadores que a justiça faça o bloqueio do Fundo de Participação dos Estados (FPE) ou dos Municípios (FPM).
Bancos
O diretor de Regulação do Banco Central (Bacen), Otávio Damaso, destacou que as legislações estaduais, em geral, imputam maior risco aos bancos depositários quando comparados à Lei Federal (LC 151/2015). Disse que as regras não são claras quanto à garantia de restituição dos valores, e poderá recair sobre os bancos a obrigatoriedade de assumir a recomposição caso o governo não o faça. “Esses riscos geram insegurança para os bancos depositários”, afirmou.
Damaso avalia que “quanto menor for o fundo de reserva, maior será o risco de que o titular vitorioso em processo administrativo ou judicial não receba imediatamente o recurso que lhe cabe”. Ele acrescentou que este fato pode gerar conflitos de diversas naturezas em relação aos depositantes, bancos depositários e entes federados. Ao final, sugeriu pela ótica da regulação prudencial a criação de regra única e explícita que afaste qualquer responsabilidade dos bancos pelo não pagamento do fundo de reservas e a constituição de fundos com valores suficientes para honrar a restituição dos recursos depositados em juízo e utilizados para outros fins.
Expositores
Também estiveram presentes na audiência no período da manhã, secretários de finanças e integrantes da procuradoria-geral de Estados e municípios, Ministério da Fazenda, Tesouro Nacional, além de representantes de entidades de classe, de bancos públicos e privados, parlamentares, entidades como Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Confederação Nacional da Indústria (CNI), Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), Tribunal de Contas da União (TCU), Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).