08/09/25

Participação da FNP na II CIRSOL destaca urgência na gestão de resíduos sólidos

Brasília foi palco, entre os dias 26 e 28 de agosto, do II Congresso Internacional de Resíduos Sólidos (CIRSOL), que contou com a presença de representantes da Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP) no debate de um dos desafios urbanos e ambientais do Brasil. As discussões levantadas pelos gestores municipais mostram que se trata de um tema que atravessa educação, saúde, inovação tecnológica, justiça social e até a forma como as cidades se preparam para enfrentar a crise climática.

Na mesa de abertura, a prefeita de Abaetetuba/PA, Francineti Carvalho, deu o tom das discussões ao levar a perspectiva amazônica para o centro do debate. Vice-presidente de Biodiversidade da Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos (FNP), ela lembrou que a legislação sobre resíduos estabelece prazos e metas, mas frequentemente desconsidera a falta de recursos e financiamento para que os municípios consigam implementá-los. Mais do que normas, disse a prefeita, é necessário garantir apoio real e reconhecer os atores que já estão na linha de frente: catadores e populações tradicionais. “Não se pode pensar política ambiental sem ouvir e valorizar quem vive o problema todos os dias”, defendeu.

A dimensão da educação ambiental apareceu como fio condutor em diferentes experiências relatadas. O prefeito de Curvelo/MG, Luiz Paulo, apresentou projetos que transformaram a relação das escolas e comunidades com o lixo. Entre eles, o Mutirão da Coleta Seletiva, que mobiliza alunos para arrecadar recicláveis e repassar a cooperativas, premiando os melhores resultados. Os valores, que chegam a R$ 8 mil para a primeira colocação, incentivam não só os estudantes, mas suas famílias a repensarem hábitos cotidianos.

Outro exemplo é o Projeto Escola Verde, criado em 2019 e reconhecido este ano pela Câmara Municipal com o prêmio “Amigo do Meio Ambiente”. A iniciativa alia plantio de árvores a atividades educativas, mostrando como a escola pode se tornar centro de transformação cultural e ambiental.

A inovação tecnológica também ganhou destaque nos debates. Sílvio Barros, prefeito de Maringá/PR, foi enfático ao afirmar que o Brasil não pode mais enxergar o aterro sanitário como solução definitiva. Para ele, o aterro é apenas um estágio entre o lixão e um destino igualmente insustentável. O desafio, argumentou, é saltar diretamente para soluções mais ousadas, que incluam reaproveitamento energético, reciclagem avançada e economia circular. Barros provocou os colegas prefeitos ao defender medidas impopulares, como a taxa do lixo, classificando-a como ferramenta indispensável para viabilizar políticas públicas sólidas e duradouras.

Resiliência

Se os avanços tecnológicos aparecem como horizonte, as consequências da inação já são sentidas em cenários extremos. Fernando Marroni, prefeito de Pelotas/RS, trouxe um relato marcante sobre a tragédia das enchentes de 2024. Com mais de 200 vidas perdidas, prejuízos superiores a R$ 100 bilhões e milhões de pessoas afetadas, o desastre escancarou como a gestão de resíduos é parte central das emergências climáticas.

Marroni lembrou que, após a enchente, toneladas de lama contaminada se acumularam, sobrecarregando o sistema de coleta e impondo um custo altíssimo ao município, já que o transporte até o aterro mais próximo exige 120 quilômetros de deslocamento. Para ele, é urgente criar planos específicos de manejo de resíduos pós-desastre, uma vez que esse tipo de material exige procedimentos próprios e ainda carece de reconhecimento nas políticas nacionais.

Amazônia

As desigualdades territoriais também atravessaram o debate. Francineti Carvalho voltou à cena para mostrar a complexidade de Abaetetuba, cidade que reúne áreas urbanas, rurais, quilombolas e ribeirinhas. Para ela, pensar políticas públicas de educação ambiental nesses contextos exige criatividade e adaptação, já que muitas vezes é preciso manter escolas mesmo com apenas uma dúzia de alunos em uma ilha isolada.

A prefeita destacou ainda a importância de enxergar a educação ambiental não apenas como disciplina escolar, mas como uma prática integrada à gestão municipal. Em Abaetetuba, os servidores receberam canecas para reduzir o uso de descartáveis; pontos de coleta foram criados em parceria com cooperativas — majoritariamente formadas por mulheres — e projetos como o Complexo de Sustentabilidade aproximam a população de temas como reciclagem, agricultura e saúde. “Lixo é problema individual e coletivo. E, na prática, são as mulheres que carregam esse peso”, concluiu.

No mesmo espírito, a prefeita relacionou a gestão de resíduos à Agenda 2030 da ONU, lembrando que os avanços na área impactam diretamente os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), além do ODS 18, adotado pelo Brasil para tratar da igualdade étnico-racial. Ela ressaltou a necessidade de adaptar a linguagem técnica a narrativas acessíveis, capazes de dialogar com comunidades tradicionais e populações ribeirinhas. Para a gestora, valorizar saberes locais e experiências de catadoras e quilombolas é parte essencial da construção de cidades sustentáveis.

Fórum de Gestores de Limpeza e Resíduos Sólidos

O encontro terminou com a reunião do Fórum de Limpeza e Resíduos, na sede da FNP. O encontro contou com a participação de Mano Medeiros, prefeito de Jaboatão dos Guararapes/PE e vice-presidente de Resíduos Sólidos da FNP, secretários de meio ambiente e limpeza urbana e representantes da Agência Nacional de Águas (ANA) e do Programa de Parceria e Investimentos (PPI) para discutir desafios como o fechamento humanizado de lixões, novas normas de regulação e formas de cobrança pelos serviços.

Ao final, foi eleita a diretoria provisória que comandará o Fórum pelos próximos seis meses: José Werner Brito (presidente), Carlos Alberto Hundertmarker (1º vice-presidente) e um representante da Comlurb, do Rio de Janeiro, ainda a ser indicado, como 2º vice-presidente. Aqueles que quiserem ingressar no Fórum devem manifestar interesse em: Inscrições

A mensagem final foi unânime: a gestão de resíduos não é tema secundário. Está no centro da agenda climática, da saúde pública e do desenvolvimento sustentável. Exige cooperação entre governos, ciência, iniciativa privada e sociedade. E, sobretudo, precisa de coragem política para enfrentar resistências, garantir investimentos e reconhecer que o futuro das cidades brasileiras passa, inevitavelmente, pelo destino do seu lixo.

 

Última modificação em Segunda, 08 de Setembro de 2025, 17:26
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