20/05/20

Prefeitos brasileiros e franceses partilham vivencias adotadas para mitigar a crise do coronavírus

O Brasil registrou nessa terça-feira, 19, mais de mil mortes provocadas pelo novo coronavírus em um único dia. No balanço total, o país apresenta mais de 271 mil casos confirmados da doença e quase 18 mil mortes. Um drama sanitário e social que a França também conhece. De acordo com as informações da universidade Johns Hopkins, o país europeu já superou a marca de 180 mil pessoas infectadas e 28 mil óbitos, em decorrência da covid-19. Para debater as medidas que podem ser adotadas no enfretamento desse cenário, a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) promoveu nesta quarta-feira, 20, uma live com governantes dos dois países.

As experiências da França foram apresentadas pelos prefeitos de Nanterre, Patrick Jarry; de Estrasburgo, Roland Ries; e pelo conselheiro delegado para a Europa da Cidade de Paris, Hermano Sanches Ruivo. Do Brasil, participaram do encontro os prefeitos de Niterói/RJ, Rodrigo Neves, e de Belém/PA, Zenaldo Coutinho.

Como na maioria das cidades, a principal medida de combate à COVID-19 adotada pelo município de Estrasburgo foi o isolamento social. Iniciada em março, a ação foi seguida por recomendações sobre a necessidade de distanciamento das pessoas, o que resultou no fechamento de escolas, comércios, restaurantes e todos os tipos de manifestação social por dois meses.

“Não foi nada fácil empreender essa medida. Principalmente junto aos nossos cidadãos, que ficaram surpreendidos, pois sabemos que uns dos fundamentos da democracia é a liberdade. Mas, apesar disso, eles aderiram, respeitaram e adotaram as medidas de isolamento social”, pontou o prefeito Roland Ries, que também é presidente da Cités Unies France (CUF).

Nesse processo, Ries destacou os esforços dos governos de todas as esferas do país para unificar o discurso e apresentar um plano de ação convergente para todos. “Fomos além de nossas divergências políticas. Sei que, infelizmente, no Brasil, esse não é o caso.”

Com 500 mil habitantes, Niterói foi a primeira cidade do estado do Rio de Janeiro a ter um óbito decorrente da COVID-19. Segundo o prefeito, a situação levou o município a adotar imediatamente um plano de contingenciamento pautado na ciência, mas que integrasse a saúde e o apoio social.

“Criamos uma renda básica temporária até dezembro de 2020, para 50 mil famílias pobres da cidade e também um programa de apoio às pequenas empresas, em que a prefeitura, por três meses, vai arcar com a folha de pagamento das empresas com até 19 funcionários, mas essa condição não é a realidade da maioria das cidades brasileiras”, explicou o prefeito Rodrigo Neves, vice-presidente de Cultura da FNP.

Segundo o prefeito, as medidas de isolamento social implementadas durante 60 dias permitiram que Niterói registrasse a menor taxa de letalidade da região metropolitana do Rio de Janeiro. Agora, o município se prepara para retomar as atividades gradualmente, processo que será iniciado nessa quinta-feira, 21.

Em Nanterre, a administração local encontrou dificuldades para conscientizar a população sobre a importância de cumprir a quarentena, sobretudo nas comunidades mais vulneráveis. Segundo Jarry, que também preside o Fórum das Cidades Periféricas de CGLU, a situação foi revertida com o trabalho de conscientização, que descartou a necessidade de impor medidas coercitivas. “As medidas de isolamento foram aceitas, mas com muita dificuldade. Isso, principalmente, pelo contexto social e político, pois as eleições municipais estavam programadas para dias antes da instauração do isolamento”, complementou o prefeito.

Para o prefeito de Nanterre, no entanto, a maior complicação enfrentada pelos gestores está justamente na retomada das atividades, já que muito fatores precisam ser articulados e avaliados para garantir um ambiente seguro. “Você precisa reexaminar, a cada passo que toma, quais respostas pode dar de forma gradual, progressiva e isso envolve uma série de fatores, como escolas, setor de esportes, trânsito, a utilização de máscaras”, alertou.

Na avaliação do prefeito de Niterói, a situação brasileira é mais complexa ainda pelos problemas históricos de pobreza e desigualdades. “A pandemia é, evidentemente, um fenômeno da saúde, mas que também tem implicações econômicas e sociais muito graves. No caso da COVID-19 é mais ainda, porque basicamente a única estratégia para impedir a explosão dos hospitais é o isolamento social.”

A avaliação foi compartilhada pelo prefeito de Belém, que expôs os contrastes vividos na capital paraense. Segundo Zenaldo Coutinho, apesar de estar inserida na Floresta Amazônica, região que detém “riquezas naturais exuberantes”, Belém vive, paradoxalmente, em “um território de pobreza”.

Segundo o prefeito, a cidade também adotou a prática de isolamento social, mas duas particularidades impediram a consolidação da estratégia. “Nós temos muitas famílias coabitando em pequeníssimos espaços em nossas favelas, em nossas áreas de periferia, e as atividades econômicas de grande parte dessa população são o comércio informal ambulante. Então, as medidas mais severas de isolamento não podem ter um tempo tão largo, como se pode fazer em outras cidades do mundo, porque já estamos vivenciando problemas gravíssimos de fome, com a paralisação da atividade econômica”, enfatizou.

Após monitorar os dados sobre o novo coronavírus na região, o prefeito acredita que a cidade já não está mais no pico da pandemia e, por isso, avalia a reabertura das atividades na próxima semana, mas com prudência. Até lá, Belém segue em lockdown. “No nosso caso, precisamos adotar a prudência, a cautela, as medidas de proteção, mas temos urgência para a retomada da atividade econômica pelo empobrecimento muito grave e a difícil recuperação desta economia já fragilizada.”

O trabalho desenvolvido pelos municípios foi ressaltado por Hermano Sanches Ruivo. Para o representante de Paris, a crise provocada pelo novo coronavírus tem evidenciado a importância dos municípios na efetivação das políticas públicas. “O papel das cidades é muito mais importante do que se podia imaginar. Com essa pandemia, há uma virada nesse tratamento, que será necessário fazer entre o estado e o aspecto mais local”, acrescentou.

A live realizada hoje integra a série de reuniões online realizadas pela entidade com representantes internacionais para tratar o tema. Todos os encontros são transmitidos ao vivo na página do Facebook da FNP e com tradução consecutiva.

Redator: Roberta Paola

Editor: Lívia Palmieri

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