Autora do livro “Segurança pública para virar o jogo”, Melina Risso, apresentou a publicação como alternativa para ampliar o diálogo na sociedade
“Segurança pública é responsabilidade compartilhada e vários atores precisam ser envolvidos e ter responsabilidade por isso”. A frase da Melina Risso, autora do livro “Segurança pública para virar o jogo”, lançado nesta terça-feira, 25, na sede da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), em Brasília/DF, deu o tom do debate sobre esse, que é o principal problema do país para 38% da população. Escrito em conjunto com Ilona Szabó, a publicação da editora Zahar tem o objetivo de auxiliar na reflexão das pessoas.
Conforme Melina, o conteúdo é simples e tem o objetivo de abrir um diálogo com a sociedade e empoderar as pessoas para que elas entendam porque, muitas vezes, as soluções que aparecem no debate público não dão resultado. Segundo ela, isso ocorre porque, de fato, acaba não dialogando com o sistema como um todo. “É muito mais complexo, não tem uma solução única que vai mudar toda a questão da segurança pública. É uma responsabilidade compartilhada de muitos entes e muitos atores”, disse.
De acordo dados divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2017 foram registrados 63 mil homicídios no Brasil. Conforme o coordenador de Unidade de Estado de Direito (UNODC), Nívio Nascimento, em números absolutos, o Brasil é o país com o maior numero de homicídios do mundo. “É uma cidade do interior que desaparece todos os anos”. Para Nívio, existem “evidências claras de como enfrentar o problema”. Ele acredita que basta olhar para experiência dos outros e aprimorar o que foi feito para o contexto local.
“Passou da hora de olharmos para evidencias e para os números. Fazer política no ‘achismo’ não cabe mais. Primeiro porque não funciona e depois porque a gente vive uma real restrição orçamentária”, destacou Melina. Para a autora, reduzir o número absurdo de homicídios deve ser foco número um, mas os custos não podem ser ignorados. “O ultimo estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos [do governo federal] fez um calculo da perda produtiva de um jovem e gira em torno de R$ 550 mil”, disse. Conforme a Folha de S. Paulo, que teve acesso exclusivo ao estudo e divulgou dados em julho deste ano, para cada jovem de 13 a 25 anos que morre assassinado, o Brasil perde cerca de R$ 550 mil.
“O papel do governo federal como liderança indutora é fundamental”, afirmou o secretário-chefe do gabinete de assuntos estratégicos do governo de Goiás, Ricardo Balestreri. Para ele, a lógica tradicional da constituição deu toda a responsabilidade para os estados, no entanto deve abranger ações da União e dos municípios. “Essa parceria para tratar de segurança pública tem que ser feita tanto entre os entes do poder formal, como entes internacionais, entes locais, organizações não governamentais. A segurança tem que ser assumida por todos”, disse. Balestreri também chamou atenção para o poder “financiador” do governo. “As pessoas entendem a linguagem do financiamento. Você não consegue induzir política publica chamando e pedindo boa vontade”, concluiu.
O tema da segurança pública estará em um documento que dirigentes da FNP irão apresentar ao próximo presidente da República. Conforme o secretário-executivo da FNP, Gilberto Perre, durante a 74ª Reunião Geral da entidade, em São Caetano/SP, os prefeitos terão uma agenda com próximo chefe do executivo. “No dia 28, os prefeitos irão apresentar um documento, aprofundando uma primeira carta já apresentada e entregue aos presidenciáveis, em maio em Niterói.
“A segurança pública é um dos temas eleitos pelos prefeitos para tratar com o próximo presidente da República e penso que esse debate servirá de subsídio para que esse documento, de fato, tenha consequência”, afirmou o secretário-executivo da FNP, Gilberto Perre. Durante a 74ª Reunião Geral da entidade, em São Caetano/SP, os governantes municipais terão uma agenda com próximo chefe do executivo, no dia 28 de novembro, para aprofundar a carta apresentada, em maio deste ano, na 73ª Reunião Geral, a todos os candidatos à presidência.
Educação
De acordo com a publicação, 75% da população carcerária não teve acesso ao ensino médio. A importância da educação no combate à criminalidade e à violência foi um ponto bastante discutido na mesa.
Segundo a antropóloga e professora da Universidade de Brasília (UNB), Haydeé Caruso, é na passagem do Ensino Fundamental I para o Ensino Fundamental II é quando os problemas aparecem. “A gente olha muito pouco pra escola e aí o município tem papel central nessa discussão. Ele precisa entender que as políticas de educação e de segurança, no tema da prevenção à violência, estão interligadas e que esse é um lócus importante”, disse.
Haydeé falou, ainda, sobre a expectativa da sociedade por uma militarização da escola. Conforme a estudiosa, a falta de autoridade da figura do professor é uma problemática que precisa ser enfrentada. Ela defende que a polícia pode ter um papel importante na interlocução, como por exemplo, na mediação de conflitos. “É preciso fomentar políticas educacionais que não coloquem o jovem no lugar daqueles que são o mal que a gente precisa extirpar”, disse.
Para Gilberto Perre, até a arquitetura das escolas pode ser opressora e passar uma mensagem equivocada para um ambiente de ensino. “Na complexidade do ser humano, o modelo formal de ensino pode não se adequar a algumas crianças e nós temos que oferecer alternativas”.
Políticas para mulheres
No que diz respeito a políticas de segurança para mulheres, Haydeé destacou algumas conquistas, como a Lei Maria da Penha e a implementação de delegacias voltadas às mulheres em todos os estados brasileiros. No entanto, ela afirma que a questão é mais ampla e passa pela forma como a sociedade lida com a questão no cotidiano. “A gente tem visto, ao longo do tempo, um recrudescimento nessa temática. Esse ano, em especial, foi traumático. A ponta do iceberg é o noticiário com o feminicídio, que mostra uma pedra de gelo gigantesca de relações que são extremamente violentas”, destacou.
A estudiosa defendeu, ainda, que um dos lugares importantes para essa discussão é o ambiente escolar. “A gente tem visto uma demonização desse tema no ambiente escolar, com a ideologia de gênero, mas o fato é que não é possível criar crianças e adolescentes sem fazer essa discussão”.
Melina Risso acrescentou que mecanismos de controle de armas são importantes para a defesa. “A arma é um elemento de crime e causa problemas em diversas áreas. É um pilar fundamental que afeta a questão da violência doméstica e a violência de gênero de forma significativa”, afirmou.
Papel da sociedade
Para finalizar, Melina fez um chamado para que cada indivíduo olhe como tem se comportado na sociedade e de que maneira isso afeta a segurança pública. “Esperar que o estado resolva 100% dos problemas é fadar o debate ao fracasso”.