Equiparar crimes de ódio pela orientação sexual aos de racismo e contra idosos já será um avanço
Um marco histórico do combate à violência contra homossexuais tem data para acontecer. O julgamento de ações no STF (Supremo Tribunal Federal), nesta quarta-feira (13), representa a possibilidade de o Brasil reconhecer a cidadania de milhões de pessoas. Os processos pautados pedem que seja determinado, ao Congresso Nacional, aprovar legislação específica de criminalização da homofobia, passo importante para enfrentar a desonrosa liderança do Brasil no ranking dos países que mais matam LGBTQ+.
O quadro de violência e discriminação tem se agravado, tornando, em muitos casos, inviáveis o exercício de direitos fundamentais e a livre orientação sexual e de identidade de gênero. Hostilidades e agressões, como os “estupros corretivos” para lésbicas e o recente caso da travesti assassinada em Campinas (SP), que teve seu coração extirpado, não podem apenas se transformar em estatísticas. Em 2011, em São João da Boa Vista (SP), pai e filho, ao andarem abraçados, foram agredidos por sete amigos. O pai teve um pedaço da orelha decepada e a justificativa era a de que “pareciam gays”.
Levantamento do Grupo Gay da Bahia mostra que, a cada 20 horas, um LGBTQ+ teve morte violenta no Brasil. Mais de 72% foram casos de assassinatos e 24% de suicídios. Isso reflete, ainda, outra grande dificuldade dessa população. Com pouca aceitação por parte das suas próprias famílias, cabe ao Estado garantir e proteger esses cidadãos, pois muitas vezes a única alternativa para a liberdade e para uma vida digna é a rua. Mas se a rua também não é lugar seguro, como sobreviver?
Segundo a pesquisa, em 2017, 445 pessoas foram mortas em crimes motivados por homofobia. O saldo é três vezes maior do que o observado há dez anos. No entanto, os dados certamente estão subestimados tanto por falta de diretrizes para os registros quanto pelo preconceito de familiares.
Convencidos disso, estivemos com os ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli, presidente do STF, e salientamos a importância da implementação de legislação específica. Ter os casos de violência cadastrados corretamente, assim como é feito desde 2015 com os registros de feminicídio, permitirá, por exemplo, compilar informações fidedignas e planejar políticas públicas efetivas.
Mais de 60 cidades desenvolvem ações nessa área. Mas é necessário ampliar e qualificar esses serviços, como, por exemplo, melhorar o fluxo de encaminhamentos das denúncias de violação de direitos e atuar fortemente na prevenção do suicídio juvenil, recorrente nesse público.
É preciso promover cidadania de forma justa e igualitária, oferecer educação para o respeito e a tolerância. Equiparar os crimes de ódio pela orientação sexual aos de racismo e contra idosos já será um avanço para enfrentar a homofobia. A exemplo de mais de 40 países, o Brasil precisa atualizar e modernizar sua legislação para prevenir e enfrentar a violência contra LGBTQ+. Homofobia mata.
Jonas Donizette
Prefeito de Campinas (SP) pelo PSB, é presidente da Frente Nacional de Prefeitos
Edgar de Souza
Prefeito de Lins (SP) pelo PSDB, e vice-presidente da Frente Nacional de Prefeitos para LGBTQ
*Publicado originalmente na Folha de S.Paulo em 13/02/2019