*Willian Alberto de Aquino Pereira -
Em 2018 ocorreram greves de ônibus em 14 cidades ou regiões metropolitanas do País, onde viviam 16,5 milhões de habitantes. Em 2019 foram 17 locais que abrangiam 31 milhões de moradores. Este ano de 2020, até novembro, 61 cidades ou regiões metropolitanas, com mais de 53 milhões de habitantes, tiveram pelo menos um dia de greve de rodoviários. E ao longo dos meses desse ano os números vêm progressivamente crescendo, sem contar os sistemas que tiveram aviso de greve ou a tiveram suspensas no último momento, incluindo metros, trens e barcas (1).
A redução da demanda pagante foi significativa e vai continuar assim durante algum tempo, com 80% de queda em março e cerca de 50% em setembro, comparada com 2019. Em artigo (2) publicado em maio/junho desse ano a estimativa era que a demanda em transporte público cairia 40% por causa da pandemia, com o impacto diminuindo ao longo do tempo, como se está observando.
As ruas estão começando a ficar congestionadas pelos automóveis nos picos e as motos estão aumentando muito.
A oferta de viagens teve uma significativa queda, para se ajustar à demanda, mesmo mantendo uma quantidade de viagens que atendesse às exigências sanitárias, reduzindo cerca de 50% em abril a 25% em setembro.
Isso levou à falência muitas operadoras (no Brasil aproximadamente 15 empresas ou consórcios encerraram suas operações) e a uma grande demissão de empregados do setor, apesar de muitas suspensões de contratos trabalhistas, redução de jornadas de trabalho e salários. Aproximadamente 28 mil pessoas tiveram perda de trabalho, mesmo considerando os admitidos. A estimava é de quase 9 bilhões de reais ser o prejuízo das operadoras de ônibus, entre março e dezembro de 2020.
Tudo isso influenciou muito a rotina das pessoas e das cidades, com uma visível tendência de colapso dos transportes públicos advindo da paralização dos serviços.
Isso precisa ser alertado. Se não forem tomadas medidas tempestivas a quantidade de greves poderá explodir no primeiro trimestre de 2021, simultaneamente ao início dos novos mandatos municipais.
É uma questão de segurança pública também. Isso abre espaço para transporte não regular, quase sempre controlado por grupos alheios à administração ordeira.
Há um risco significativo de se ter mais frentes de desequilíbrio social e violência urbana.
Em paralelo com a existência e logística da vacinação o transporte urbano tem que ser tratado com urgência. E não apenas para os ônibus, mas também para os trens, metros, VLT, barcas.
O investimento no transporte público tem alto interesse social, econômico (3) e estratégico, podendo mudar a qualidade de vida e a eficiência de uma cidade:
– No campo social, o transporte público de qualidade aumenta o acesso aos empregos, aos serviços sociais, ao comércio, à cultura e ao lazer;
– No campo econômico, o transporte aumenta a oferta de empregos e as trocas comerciais;
– No lado ambiental, o transporte adequado ajuda a reorganizar o espaço urbano e a reduzir o uso do automóvel, causando menor poluição atmosférica;
– Investimentos no transporte e trânsito poderão reduzir os custos econômicos dos deslocamentos, mesmo com uma frota crescente de veículos particulares.
Sem transporte público a cidade para e a administração municipal pode ficar refém de uma situação muito complexa, de difícil solução, com impacto sobre toda a população, por longo tempo e custos sociais, econômicos e financeiros elevadíssimos. (3) E nós?
Fontes:
(1) Diário do Transporte, ANTP, NTU, órgãos de gerência, operadores, usuários, visitas a terminais, pontos de parada, outros meios de comunicação e eventos pelas redes sociais.
(2) De volta à cidade do futuro…desejado – ANTP – Junho 2020
(3) Para onde vamos? – ANTP – 2008
Willian Alberto de Aquino Pereira é coordenador Rio de Janeiro da Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP)
*Artigo originalmente publicado no Diário do Transporte de 10 de dezembro de 2020.