11/02/15

Os precatórios e o bom gestor público

Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S.P

Uma das maiores lutas dos prefeitos e governadores eleitos nos últimos anos têm sido pagar as dívidas deixadas por seus antecessores. Alguns deixaram rombos bilionários. Seja por falta de caixa ou má gestão, o fato é que quem paga por isso são os munícipes, que veem suas cidades sendo deterioradas por falta de investimentos públicos essenciais, como saúde, educação, habitação ou projetos básicos de infraestrutura como saneamento e asfalto.

A falta de recursos vem sendo agravada com a decisão do Supremo Tribunal Federal de declarar inconstitucional a Emenda n.º 62/2009 que, entre outros temas, instituiu o regime especial de pagamento dos precatórios judiciais dentro do prazo máximo de até 15 anos.

O relator do processo, ministro Luiz Fux, determinou que o fluxo de precatórios do período 2014-2018 seja liquidado até o final de 2018, e declarou nulas, com efeito retroativo, as regras que instituíam o índice da poupança para correção monetária e o cômputo dos juros moratórios dos precatórios. A decisão também anulou o pagamento de precatórios por leilões ou acordos após o trânsito em julgado das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADINs), porém sem efeitos retroativos.

Neste momento, a modulação está suspensa, com o pedido de vistas do Ministro Dias Toffoli. Estados e municípios, secundados pela União, e em diálogo com outros atores, como a própria OAB, enquanto isso, vêm discutindo a possibilidade de que se introduzam novos procedimentos, como o limite de 3% da receita para os pagamentos e a formação de um fundo garantidor para financiar os pagamentos. Os municípios temem que a simples declaração de inconstitucionalidade da Emenda 62 venha deixar vários deles totalmente ingovernáveis.

É incontestável que todos os credores dos poderes públicos têm o direito de receber seus créditos, de forma a resguardar o princípio da legalidade. No entanto, considerando-se que a Constituição Federal é, acima de tudo, uma Carta de princípios, voltada não apenas para um, mas para todos os segmentos da sociedade, é certo que ao STF caberá conciliar os efeitos da decisão com os demais direitos dos cidadãos, evitando-se, desta forma, a insegurança jurídica, o descontrole financeiro e o caos administrativo.

A interpretação literal da decisão acarretará gravíssimos prejuízos à sociedade em geral, pois precisamos considerar os direitos dos demais cidadãos que, embora não sejam credores judiciais dos órgãos públicos, são credores da saúde, da educação, dos serviços públicos em geral e, acima de tudo, de uma boa administração.

Guarujá tem precatórios a pagar de aproximadamente R$ 500 milhões, quase a metade de sua receita anual própria, decorrentes de processos judiciais iniciados em administrações passadas, que foram organizados pelo atual governo para quitações dentro das regras estabelecidas pela Emenda Constitucional n.º 62/2009.

O retrocesso da regra constitucional e a interpretação literal,sem modulação, da decisão da Suprema Corte, praticamente inviabilizaram os serviços essenciais e os investimentos em andamento. Como exemplo, houve sequestros no caixa da prefeitura de Guarujá em todas as áreas – saúde, educação, obras na ordem de R$ 33 milhões – e isso trouxe prejuízos imensuráveis aos cidadãos.

Com a decisão do STF, nós, governantes, teremos de optar entre o atendimento do interesse público, o atendimento aos credores dos precatórios, e a possibilidade de sofrermos pesadas sanções pessoais em razão do descumprimento de um ou de outro dever constitucional.

Diante dessa situação caótica, a Frente Nacional de Prefeitos (FNP) vem trabalhando e se reuniu com alguns ministros do STF, entre eles, Marco Aurélio de Mello, Luis Roberto Barroso, Rosa Weber, Ricardo Levandowski, Cármem Lúcia e Gilmar Mendes, com o Advogado Geral da União, Luis Inácio Adams, com a OAB Nacional e as presidências da Câmara e do Senado para que, juntos, encontremos uma saída. Também as visitas aos tribunais estaduais permitiram novas tratativas com os departamentos de precatórios de cada estado.

Juntos, nós, prefeitos, podemos sensibilizar o Poder Legislativo, o Governo Federal e o próprio Supremo, para que o direito – tanto o dos credores dos precatórios quanto o dos credores da boa administração pública – seja preservado, buscando-se que o Poder Legislativo Federal apresente ao País uma nova proposta de emenda à Constituição, secundada por eventual legislação complementar e mecanismos de financiamento.

A dívida dos precatórios atinge – cada um com sua peculiaridade – municípios de pequeno, médio e grande portes. Não defendemos o calote, mas queremos uma oportunidade para que nós, enquanto agentes políticos e públicos, possamos fazer aquilo que a população espera e nos cobra, ou seja, investir em melhorias e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida de todos os cidadãos. A dívida dos municípios afeta diretamente a vida da população que nele vive.

Maria Antonieta
Maria Antonieta

Guarujá/SP

Vice-presidente para Assuntos de Finanças Públicas

Última modificação em Quarta, 22 de Julho de 2015, 10:17
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