Seis brasileiros, todos homens brancos, concentram a mesma riqueza que metade da população
A desigualdade é a maior responsável pela falta de harmonia e desconforto social em um país. Nações pobres com baixa desigualdade são harmônicas, enquanto ricas desiguais são conflitivas. O bem-estar social, portanto, não é somente uma questão de acúmulo de riqueza, mas de distribuição da riqueza.
A desigualdade econômica no Brasil atingiu níveis extremos, apesar do país ser uma das dez maiores economias do mundo. Mesmo quando, nas últimas décadas, milhões de pessoas foram retiradas da pobreza (movimento que refluiu nos últimos anos), o Brasil continuou entre os mais desiguais do planeta.
Seis brasileiros – todos homens brancos – concentram a mesma riqueza que a metade mais pobre da população, mais de 100 milhões de pessoas.
Os 5% mais ricos do país recebem por mês o mesmo que os demais 95% juntos. As mulheres brasileiras só atingirão a igualdade salarial em 2047 e as pessoas negras só ganharão o mesmo que as brancas em 2089, caso a tendência dos últimos 20 anos se mantenha. Esses são apenas alguns dos impressionantes dados da desigualdade brasileira.
Do ponto de vista territorial, é enorme o abismo que separa regiões extremamente pobres de lugares com índices de países desenvolvidos. Por isso a importância do enfrentamento à desigualdade na esfera pública e a necessidade de políticas que priorizem os investimentos nos locais mais pobres —direcionados para as pessoas mais vulneráveis.
É nas cidades, entretanto, que esse tema aparece com mais evidência. Em São Paulo, a Rede Nossa São Paulo publica um Mapa da Desigualdade que compara o melhor e o pior indicador em cada distrito.
Na cidade mais rica da América Latina, o mapa revela dados impressionantes como o da idade média ao morrer: 80 anos no Jardim Paulista e 58 anos em Cidade Tiradentes. Uma diferença de 22 anos na mesma cidade. A desigualdade é cumulativa e vai muito além da renda. É também de saúde, educação, saneamento, segurança e de acesso a serviços.
Mas é também nas cidades que a desigualdade pode ser melhor enfrentada. A priorização de investimentos para a população mais vulnerável e o acesso a serviços de qualidade são maneiras indiretas de reduzir as desigualdades.
Na impossibilidade de alterar a renda, os municípios podem oferecer saúde, educação e mobilidade, além de estimular oportunidades de trabalho. Por isso é importante o reconhecimento de cidades que avançam na redução das desigualdades, inspirando tantas outras.
É nesse contexto que foi concebida a terceira edição do Prêmio Cidades Sustentáveis, uma iniciativa do Programa Cidades Sustentáveis e da Oxfam Brasil, em parceria com a Associação Brasileira de Municípios e Frente Nacional de Prefeitos. A premiação será feita de acordo com resultados concretos e mensuráveis em três categorias: Desigualdade econômica (foco em gênero e raça); Acesso a serviços (Saúde, Educação e Infraestrutura); e Acessibilidade. Foram 114 boas práticas inscritas de 61 municípios, distribuídos por 15 Estados de todo o país.
Como políticas públicas podem diminuir as distorções econômicas e as assimetrias estabelecidas nas dinâmicas sociais das cidades? A proposta da premiação vai muito além de celebrar resultados e de exaltar políticas públicas exitosas. O processo até chegar aos vencedores é longo e tem um caráter pedagógico e mobilizador. O estímulo a iniciativas regionais que priorizem à redução das desigualdades —com impactos mensuráveis, potencial multiplicador e alcance em grande escala— é o que fundamenta a implementação do Prêmio Cidades Sustentáveis. Em outras palavras, muito mais do que valorizar ações sociais isoladas, uma “boa prática” exige investimento, integração e continuidade.
A cerimônia de entrega do prêmio acontecerá no dia 18 de setembro, em São Paulo, durante a conferência “Catalisando Futuros Urbanos Sustentáveis”. O evento reunirá o 3º Encontro Anual da Plataforma Global Cidades Sustentáveis do Banco Mundial e a 2ª Conferência Internacional Cidades Sustentáveis. Será uma oportunidade para mobilizar e inspirar cidades e a sociedade civil para reduzir as desigualdades.
Jorge Abrahão
Coordenador geral do Instituto Cidades Sustentáveis, organização realizadora da Rede Nossa São Paulo e do Programa Cidades Sustentáveis.
Artigo originalmente publicado na Folha de S. Paulo em 7 de agosto de 2019.